Em seis meses, hospitais revertem taxas de cesáreas de 10 anos
Os primeiros resultados das ações para incentivar o parto normal e melhorar a assistência à saúde de gestantes e bebês nos hospitais que integram o projeto Parto Adequado já mostram avanços significativos. Em seis meses de implantação, a iniciativa, desenvolvida pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Hospital Albert Einstein e Institute for Healthcare Improvement (IHI) ajudou a aumentar em 7,4 pontos percentuais a taxa de partos normais nos estabelecimentos participantes, iniciando a reversão dos altos números de cesáreas registrados nos últimos 10 anos no Brasil.
Os resultados parciais foram apresentados nesta terça-feira (27), em São Paulo, durante encontro dos participantes do projeto. Nos 42 hospitais públicos e privados que estão desenvolvendo a iniciativa, a taxa de partos normais está em uma curva ascendente: passou de 19,8% em 2014 (média) para 27,2% em setembro de 2015. A redução da taxa de cesáreas para 72,8% após a implantação do projeto equivale ao salto que o índice deu em praticamente uma década – de 2006 a 2015 -, período em que passou de 75,5% para 85,5%. Veja, abaixo, o gráfico com as percentagens de partos normais e cesáreas na saúde suplementar.
“Esses resultados são muito animadores. Significa que em menos de um ano nós conseguimos reverter a escalada de uma década no número de cesáreas. Se continuarmos nesse caminho, não teremos apenas menos partos cirúrgicos sendo feitos: teremos gestantes e bebês mais saudáveis e menos mortes relacionadas à prematuridade, que são consequências de cesáreas desnecessárias”, afirma Martha Oliveira, diretora de Desenvolvimento Setorial da ANS. “Além desses resultados imediatos, outras importantes conquistas virão, como o aperfeiçoamento do modelo de assistência à saúde, com a construção de uma rede de assistência à saúde mais eficiente e resolutiva, beneficiando os consumidores e todo o sistema. Trata-se de um conjunto de mudanças profundas na lógica de organização dos prestadores de serviços de saúde”, completa a diretora, destacando que a ANS está monitorando o setor com um grupo controle para avaliar se fatores externos ao projeto estão afetando os resultados. Desde que foi implementado, não houve mudança dos números anteriores.
O engajamento dos participantes do projeto foi um fator determinante para os resultados obtidos. “Há um ano assinamos o Acordo de Cooperação entre IHI, ANS e Einstein para redução da taxa de cesáreas desnecessárias e melhoria da atenção ao parto no Brasil. Como líder clínico deste projeto, o Hospital Israelita Albert Einstein, que apesar da alta complexidade da maternidade já contava com 22% de partos normais em 2014, assistiu à pronta adesão dos 42 hospitais como se uma necessidade geral fosse atendida”, afirma Miguel Cendoroglo Neto, diretor superintendente do Hospital Israelita Albert Einstein e diretor do projeto Parto Adequado. “Ainda há muito trabalho pela frente, mas estamos confiantes de que atingiremos resultados ainda melhores até setembro de 2016, quando passaremos da fase piloto para a disseminação das mudanças que apresentaram resultados”, completa.
Paulo Borem, representante do IHI, também comemora os primeiros resultados do projeto: “Pela primeira vez no Brasil, várias organizações reúnem-se em torno de um objetivo comum, que é melhorar o cuidado materno-infantil utilizando o modelo de melhoria contínua do IHI”, disse.
Medidas
As estratégias para redução de partos cirúrgicos desnecessários desenvolvidas pelo Projeto Parto Adequado tiveram início em outubro do ano passado, com a assinatura do termo de compromisso que deu origem à iniciativa. Em março, após um período de inscrição voluntária, foram selecionados os hospitais (37 privados e quatro com atendimento pelo Sistema Único de Saúde, além do Hospital Albert Einstein) participantes do projeto e as atividades tiveram início.
Para estabelecer as mudanças, os estabelecimentos estão fazendo adequações de recursos humanos e da ambiência hospitalar para a incorporação de equipe multiprofissional nos hospitais e maternidades; capacitação dos profissionais para ampliar a segurança na realização do parto normal; engajamento do corpo clínico, a equipe e as próprias gestantes; e promovendo a revisão das práticas relacionadas ao atendimento das gestantes e bebês, desde o pré-natal até o pós-parto. “Uma das medidas mais importantes nesse processo foi a proposição de uma nova organização do cuidado, pois só mudando o modelo de prestação de serviços os resultados poderão ser alcançados”, destaca a diretora.
“Precisamos mudar a assistência passo a passo, sem que haja aumento de eventos adversos”, comenta Claudia Garcia, diretora de qualidade do Einstein e integrante da equipe do Projeto. O Einstein subsidiou o treinamento para 280 profissionais dos hospitais participantes no Centro de Simulação Realística da Unidade Morumbi, para que o retorno às taxas de partos normais se dê com segurança na prática obstétrica.
“O investimento nas ações de mudança propostas para todos os hospitais piloto foi surpreendente, como contratação de plantonistas e enfermagem especializadas para melhoria na qualidade e segurança nas maternidades, reformas para acomodar acompanhantes durante o trabalho de parto aumentando o conforto das gestantes, reuniões científicas para revisar diretrizes da assistência ao parto e espaço para ouvir as gestantes. Com infraestrutura e excelência na assistência, o Einstein também experimentou a subida nas taxas de partos normais. O engajamento dos médicos nos novos modelos assistenciais propostos foi muito satisfatório, com a idéia do trabalho em equipe vindo ao encontro do início da mudança no sistema”, afirma Rita Sanchez, coordenadora da maternidade do Hospital Israelita Albert Einstein e obstetra do Projeto.
Três modelos assistenciais foram sugeridos aos hospitais, que puderam escolher o que melhor atende as necessidades: no primeiro, o parto é realizado pelo plantonista do hospital; no segundo modelo, o parto é realizado por médico pré-natalista do corpo clínico, com suporte da equipe multidisciplinar de plantão, que faz o acompanhamento inicial da parturiente até a chegada de seu médico; e no terceiro, o parto é assistido por um dos membros de uma equipe de médicos e enfermeiras, composta por três ou mais médicos e enfermeiras obstetras. A parturiente se vincula à equipe que terá sempre um médico e uma enfermeira obstetra de sobreaviso para realizar a assistência do trabalho de parto e parto.
“O Breakthrough Series (BTS), também chamado de Colaborativa, é uma metodologia que já foi utilizada em várias partes do mundo com grande sucesso, conseguindo alcançar o aumento de partos vaginais de forma segura”, ressalta Paulo Borem. “O IHI sente-se muito honrado em participar desse projeto junto com a ANS e o Hospital Israelita Albert Einstein”, diz ele.
Mais de 30 operadoras de planos de saúde também se engajaram à iniciativa. O apoio se dá com a orientação e direcionamento das beneficiárias que desejarem o parto normal na rede de prestadores, criação do Espaço Parto Adequado em seu portal eletrônico, priorização dos interesses das gestantes e suas famílias na organização e avaliação de viabilidade financeira dos modelos assistenciais inovadores a serem implementados nos hospitais apoiados, com a construção de propostas para financiamento. “O mais importante é que as operadoras se colocaram na posição de protagonistas nesse processo de mudança do modelo de pagamento por procedimento. Só assim as mudanças terão perenidade, pois se reforçará o modelo correto de prestação de serviço”, avalia Martha Oliveira.
Outros indicadores
Além da melhoria na taxa de parto normal e redução de cesarianas desnecessárias, a implantação do Projeto Parto Adequado tem acompanhado outros indicadores de saúde nos hospitais envolvidos no projeto, como as admissões e custos em UTI neonatal, satisfação da gestante com a equipe e o hospital e taxa de eventos adversos. O monitoramento desses indicadores também permite avaliar os resultados das medidas. Eles serão divulgados futuramente a partir da consolidação de uma série histórica mais longa. Apesar do pouco tempo de aplicação, entretanto, já é possível verificar êxito na redução de admissões em UTI neonatal e satisfação das gestantes.
“O projeto tem uma duração prevista de 18 meses, estamos ainda no início desta jornada, mas a curva de partos normais se mostra ascendente, com resultados expressivos. Quando poderíamos imaginar que apenas após seis meses de implantação do projeto já teríamos uma queda para 72,8% na taxa de cesarianas nos hospitais privados participantes? Esses resultados nos dão ânimo para seguir em frente, mas há ainda muito trabalho pela frente”, destaca a diretora da ANS.
Confira no gráfico abaixo os percentuais de parto normal alcançados pelos hospitais participantes em 2014, antes do início do projeto, e a partir de março de 2015, quando tiveram início as ações.
Fonte: Ans